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MATERNIDADE

Mãe, Mulher, Servidora: Lutas e Resistências

Data de Publicação: 15/04/2025

Universidades reproduzem violências institucionais contra mulheres gestantes e mães, que enfrentam assédio, discriminação e sobrecarga no ambiente de trabalho.

No cotidiano das universidades e repartições públicas, entre pilhas de processos, reuniões intermináveis e metas cada vez mais inalcançáveis, há um grupo que vive um tipo específico de vigilância e julgamento. São pessoas que carregam não só crachás e currículos, mas também fraldas, agendas escolares e noites mal dormidas. No ambiente de trabalho, elas enfrentam não apenas a cobrança por produtividade, mas o peso de uma estrutura que pune a maternidade como se fosse uma falha de caráter.

Esse fenômeno tem nome: assédio materno. Ainda pouco debatido, ele é um mecanismo silencioso de controle que se manifesta por meio de comentários desqualificadores, isolamento, pressão psicológica e recusa de direitos legais. O problema não é apenas individual; ele escancara uma cultura institucional que trata a maternidade como um empecilho a ser gerenciado, e não como uma experiência social a ser acolhida.

Enquanto mães/pessoas que gestam tentam equilibrar o cuidado com o desempenho, enfrentam desconfiança sistemática. Ser mãe/pessoa que gesta no ambiente de trabalho é, muitas vezes, ser considerada ausente mesmo quando presente, descomprometida mesmo diante do esforço redobrado, frágil mesmo sustentando o peso de jornadas triplas. Os elogios por “dar conta de tudo” escondem a naturalização de uma sobrecarga que nunca foi consensual.

A violência não vem apenas de chefias; ela se dilui entre colegas, normas tácitas e políticas que fingem neutralidade. Mães/pessoas que gestam são vigiadas quando saem para amamentar, cobradas quando precisam faltar por motivo de saúde dos filhos, e ignoradas nas discussões que definem horários, metas e cargos. Muitas silenciam por medo de retaliação, outras adoecem. Todas, de alguma forma, resistem.

No interior dessa lógica, é o próprio cuidado que se torna alvo. Numa sociedade que valoriza a competitividade, o vínculo afetivo é tratado como fraqueza. A experiência materna, ao invés de ser compreendida como uma expressão potente da vida em comum, é encarada como um problema logístico. E o corpo da mulher-mãe/pessoa que gesta, submetido à constante expectativa de disponibilidade, vira território de controle institucional.

Não se trata de um problema exclusivo do funcionalismo público, mas ele se expressa com nitidez em instituições como universidades federais, onde o discurso da igualdade de oportunidades convive com práticas excludentes. O direito à licença-maternidade, por exemplo, é frequentemente acompanhado de uma cobrança moral velada: a mãe deve “compensar” o tempo “perdido”. Não raro, vê-se a tentativa de desmobilizar mães nos espaços de decisão sindical, nos conselhos universitários ou nas comissões administrativas, como se a maternidade fosse incompatível com a luta coletiva.

Mas ser mãe/pessoa que gesta não é um obstáculo — é um enfrentamento cotidiano às lógicas que desumanizam. O que chamam de “privilégio” muitas vezes é só o mínimo necessário para sobreviver. E o assédio materno, longe de ser exceção, é a regra que precisa ser nomeada, denunciada e desmontada.

Esta é a primeira reportagem da série que o Sintufs dedica às mães/pessoas que gestam trabalhadoras. Através de diferentes perspectivas, vamos investigar como gênero, maternidade e trabalho se entrelaçam em experiências marcadas por opressões, mas também por resistência e reinvenção.

Porque falar sobre maternidade no trabalho não é assunto “de mulher”. É um projeto de futuro.